ele pensa e não diz
onde tem muita água
tudo é feliz.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Oi, Kafka

Já conhecia aquele barulho. Era o vento soprando janela adentro, fazendo a persiana balançar. Foram tantas noites sem dormir por causa de tal som, acreditando serem asas de inseto gigante, que agora, desvendado o mistério, mal o percebia.
“Vem chuva por aí”, pensou. O barulho agora aumentara, o vento era forte. Foi então que notou que na varanda não corria uma brisa sequer. Achou encantador o poder da natureza: de um lado da casa (no quarto) esperava-se grande tempestade; do outro (a varanda), o céu aberto.
E assim continuou o que estava fazendo. Até que a luz se foi. Era cedo ainda, mas mesmo assim amaldiçoou o vento, por fazer estragos na rede elétrica. Seguiu-se a isso o barulho de passos. Na verdade não eram passos, eram como contas caindo no assoalho e fazendo ‘tec tec tec’, porém com intervalos de tempo que a fizeram remeter a passadas lentas.


(Há tanto tempo no meu desktop que cansei, tive preguiça de terminar. Estragando a surpresa de uma suposta continuação: ia aparecer um inseto gigante que conversaria com o personagem principal, falaria umas bobagens sobre medos e sujeira e o jantar do dia anterior. Metamorfose pra vocês.)

domingo, 23 de maio de 2010

Para o Caio

* "Para o Caio" soou diferente do que eu queria; parece que estou mandando alguém pará-lo e, definitivamente, não é isso o que eu quero. Eu tô é dedicando esse texto a ele (visto que me perdi em meio a duas histórias e agora não tô escrevendo mais livro nenhum, tão lá guardados, esperando não-sei-o-quê).


As coisas velhas vão ser sempre novidade enquanto você conhecer gente nova. Eu ia me aconselhar desta frase, mas li seu texto no intervalo entre pensar e escrever e acreditei que também te serviria bem. Se não servir, tome como uma frasezinha sem valor para a coleção.

A verdade é que não consegui comentar lá no teu blog. Estranho. Espero que você não tenha me bloqueado ou algo assim.

E o texto está absurdamente bom, até compensou a falta do título comumente genial que você põe, eu perdoei.

Te daria férias, se pudesse, te daria uma Lomo AGORA se tivesse dinheiro.
E tenho mais coisas pra falar, inclusive que não vou mais sair, porque tô com febre, mas isso é besteira, não vem ao caso.

Mande abraços para Tom, Harry, Dumby, Gaga e quem mais quiser. Abraços sempre vêm a calhar.

P.S.: Nós vamos te arrastar pro Circo. Com nariz de Palhaço.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Porra, eu!

Para quem anda com o pé: asas.
Clichezão, mas ninguém escuta. Topa aí, quero ver.

Te vi andando na rua e senti um calafrio; quando éramos nós dois não havia mãos dadas. Tinha o eterno sorrisinho de canto de boca, o assovio constante, mas mãos dadas, nunca. E por um tempo me fiz triste, quis fugir, esconder. Só que era tudo fingimento, eu estou bem. Acho que você também. Que bom que não me viu. Suspirei aliviada, não ia soltar a mão do meu namorado.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Luta Sem Clube (06/09)

Pernas pequenas demais para fugir correndo, sangue demais para limpar com as costas da mão e o lábio inchado como nunca antes. O nariz coçava, fazendo uma pequena gota começar a brotar no canto do olho. Sacudiu a cabeça e não sentiu-se tonta; animou-se para levantar. Foi aos poucos, bem devagar, apoiando-se no muro de tijolos gordurosos; sentiu nojo, mas então deu-se conta de que ela própria estava nojenta desde a ponta dos cabelos até o âmago, seja lá onde isso fica. Achou engraçado lembrar-se de sua essência logo nesse momento e riu-se por dentro sem emitir nenhum som, mas iniciou uma dor aguda não sabia onde_com certeza não era na costela, disso tinha certeza, e sentiu-se sortuda, pois quem mais briga desse jeito e sai com as costelas ilesas?. Tal constatação a animou; levantou-se de uma vez, sentindo certa vertigem, nada preocupante. A mão direita latejou fortemente, ela tentou mover, sem êxito: estava bom demais pra ser verdade e, pensando bem, era até injusto sair sem machucado sério. Uma mãoquebrada era menos do que o merecido.
De pé, agora, ensaiou um passo em direção à rua. Caiu, óbvio. Aqueles joelhos não eram mais seus, pertenciam àquela esquina úmida e fedorenta a partir de então, e ali ficariam, até que o vulto que permanecia imóvel no chão resolvesse manifestar-se e sair de sua vida. Enquanto isso, ela ia ter que procurar um lugar onde aceitassem menininhas sem pernas, sem mãos, sem âmago. Levantou de novo e dessa vez deixou o muro para trás, servindo apenas de cenário para o flagrante da briga entre duas pessoas na noite passada. Com direito a sangue e corpos estirados, inocentes até, cadáveres.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Agora que comecei, aí vai o final (decepcionante)

Piritba, 28 de abril de 2010.

Minha queridíssima Neide.

Meu beijo com todo carinho.
Pela graça de Deus, ainda vou vivendo; já tivemos várias perdas, depois de nosso longo contacto. Desculpe-me.
Quero saber tuas notícias, eu estava naquele endereço, quando morava com minha irmã.
Construir um ranchinho e agora estou neste endereço.
Muita saudade; a solidão é que está querendo me devorar, mas Deus não irá deixar.
Recomenda-me a todos teus queridos e aceite lembrança de minha família aqui.
Irmãos e sobrinhos.
O Senhor te abençoe e te guarde e faça resplandecer o Seu rosto sobre ti e te dê a paz.
Amém?
Beijos- Antenor.



(A carta foi escrita numa folha pautada com bordas decoradas em rosa e pontos vermelhos que lembram um babado. No canto inferior esquerdo tem umas flores que parecem rosas rosas com o interior avermelhado, mas estão abertas demais para serem rosas. Ocupa uma página, a parte de trás está em branco. Queria que tivesse um P.S.)

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Texto de não-ficção

Traumatizei depois que vi uma careta de nojo quando disse que estava escrevendo um livro de ficção. Acho que não quero escrevê-lo mais. De qualquer forma, não tinha um final decente mesmo. Mas fiquei triste, não escondo. Ainda tentei uma réplica: 'mas tudo é ficção', que não serviu, a careta ficou pior.
E isso tudo depois de, naquela mesma semana, ouvir 'por que é que alguém iria querer escrever algo que não fosse ficção?'. Nesse dia eu meio que previ meu futuro próximo e disse, descaradamente, que já quis escrever algo que não fosse ficção, um ensaio talvez.
Agora já não sei de mais nada. Esse é só o prólogo.

[Aqui começa a história de verdade:]

O endereço tem só um erro: minha rua é Engenheiro Coelho Cintra e na carta veio escrito Engenheiro Coelho Cintrer. Mas todo o resto está certo, inclusive uma referência, algo a mais e completamente dispensável, mas que o remetente achou melhor botar para que não houvessem dúvidas: ela só podia vir pra cá.
Vem da Bahia, de Piritiba, de um tal Antenor José de Oliveira, que tem uma letra engraçada, de adulto, grande e corrida, e um tanto quadrada.
Na frente do envelope:

"Para uma sublime pessoa:
Neide Lopes Nogueira
[E aqui entra o meu endereço, como eu já expliquei]"


Olha, é claro que eu vou abrir e ler, sabe-se lá quando vão me mandar uma carta para uma sublime pessoa de novo. Depois escrevo pro Antenor José pedindo desculpas. Espero errar o endereço. E que a Neide não se zangue. Nem me processe.

Testando: Não Achei

Onde estou eu? Quem foi que disse 'conhece a ti mesmo' ? Porque eu achava que tinha sido Sócrates, mas alguém falou que foi Jesus Cristo e isso fez toda a diferença na hora; eu tava empolgada com a ideia, mas levei um balde de água fria na barriga (porque é o lugar que acho que deve se manter quentinho), uma vez que realmente acredito em Jesus; em Deus não, nem acredito que ele esteja morto, quer dizer, talvez esteja, só que no sentido figurado, creio, mas o que vem ao ponto é que não quero que eles_Sócrates e Cristo_ mudem de lugar na minha cabeça.
Criou-se uma confusão louca: se antes queria conhecer a mim mesma, na pura essência, agora quero saber quem falou, como se a frase em si não importasse, mas só a personagem histórica, porque é isso, né, o conceito que se dane, a arte é pela arte, só existe metalinguística e parnasianismo, o resto todo é mentira, não acreditem.
Até todo esse texto, vejam só, foi só um teste, pra eu ver como ficam meus escritos sem pausas, pois pra mim as vírgulas parecem fracas em certos aspectos, preciso dos pontoevígulas e dos pontos finais, não gosto de exclamações, mas acredito que algumas vezes estas se façam necessárias, as interrogações só não as coloco seguidas de outro ponto porque foge à lei_eu devia então fugir à lei, só por auto-satisfação (hifenada, para ser pausada, quando necessito, escrevo tudojunto).
Na verdade, um desejo que tenho há tempos é ser reconhecida como escritora e nada mais; dane-se o professora, pedagoga, amiga, irmã, filha, mãe, mulher, homem, planta, vaca, babaca, lá o que for, já que sei que não sou personagem dos outros, serei de mim mesma. O que é muito triste, mas não é o pior; terrível mesmo seria ter a vontade e vocação pra personagem e não conseguir nem eu mesma escrever-me. Acho que encontrei eu mesma, já me conheço desde sempre.
(E acabei sucumbindo à pausa nos momentos finais, ela não me pertence. Ela me é.)

segunda-feira, 10 de maio de 2010

O que fazer

nos domingos, de forma paliativa, é claro.
Lá vai:

_Vovós. São a melhor opção. Porque elas te amam mesmo se teu cabelo ficou mal pintado e parece um arbusto personalizado e ainda te fazem comidinhas gordas.

_M.A.D.A., Alcoólicos Anônimos, Narcóticos Anônimos, Vigilantes do Peso, Clube da Luta, enfim, esses grupos de gente saudável.

_Futebol e Cerveja. Cerveja e Futebol. Nada mais óbvio. Talvez só a Cerveja ou só o Futebol.

_Sempre há a opção do 'filminho', principalmente quando está frio. Fujam dessa. É a pior que há. Só a utilizem no caso de haver Namoro de Domingo.

_Festa de aniversário. Porque ninguém daria uma festa que não fosse de aniversário num domingo. E até isso já é meio esdrúxulo.

_Não vou recomendar Churrasco porque chega de matança de Vacas. Sugiro degustação de Vegetais. Ou viagem à Índia, onde a Vaca é sagrada.

_Análise profunda dos próprios pés. Claro, pode ser de qualquer outra parte do corpo. Mas é que os pés ficam tão longe, porém não tanto quanto a nuca ou a coluna vertebral ou ainda o cocoruto, mas esses são difíceis demais de observar.

# Advertência: desistam de poesia, amor, arte, mimimi, drama, bancos e restaurantes nesse dia. Segunda-Feira taí pra isso.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Concentrava toda sua raiva nos compulsivos cliques com a mão direita. Eram diariamente milhares de agressões distribuídas quase que silenciosamente. Naquele quarto nada acontecia, só podia-se perceber que ao fechar dos olhos, o ar pesada demais, o silêncio exalava um gosto amargo, próprio da recusa irritante à garganta do que se precisa como condição para a sobrevivência.
Desejava não ter o que escrever, visto que cada vez mais as folhas de sua agenda inutilizada faziam papel de curativo. Sangrava intermitente, apenas por estar viva e fértil. Mas a alguns olhos, seu ferimento se apresentava como doença.
Queria ver no sangue, que é morte, vida. Queria simplesmente optar pela sua condição. Talvez desejasse viver morta, sem demais preocupações que recaem somente àqueles que por natureza, só podem gozar do abate gradativo e sôfrego.
Mas era tarde, a essa altura, já só sentia. E tanto... 


(acho que vem a calhar)

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Amebíase

_O anônimo falou comigo.
_
_Hoje. Na rua.
_
_Foi só um oi. Mas é estranho.
_
_Porque eu tenho a leve impressão de ele ter virado a cara das últimas vezes que nos vimos. Não o seu anônimo, o meu anônimo. O anônimo sob intervenção.
_
_O seu anônimo a gente nem conhece. Esquece ele.
_
_Sei lá. Não o entendo.
_
_Até mais simples que amebas.
_
_Anônimos são chatos.
_Mas prefiro eles às amebas.
_Ah tá.